No segundo encontro manifestou-se entre eles uma intimidade de duradouros anos. O apartamento em condições de
guerra. Pilhas de pratos e panelas na pia, sinalizando abandono de semanas. Roupas
sujas espalhadas pelo chão. Copos cheios de bitola de cigarro disputando espaço
na mesa. Perguntou se ela se importava com a bagunça, antes que chegasse a sua
casa. A visitante recomendou que deixasse como estava. Gostaria de conhecê-lo aprofundando-se
em sua rotina.
Apesar de detestar careta, encarou
a nicotina pelo prazer da companhia dele. Horas a fio conversavam sem bebericar
um gole de água sequer. Retinha os segundos do rapaz, das idas dele
à janela para um novo cigarro que lhe acalmasse o nervoso.
Pelos cantos do chão da casa,
ferramentas. Chaves de fenda. Martelo. Alicate. Em cima da estante uma tesoura.
O homem voltou-se para o espelho, passou a mão direita nos cabelos, reprovou o
que constatou. Sabe cortar cabelo? Disparou. Não sou profissional. Você vai
arriscar? E ele prontamente pegou a tesoura, puxou uma cadeira para perto dela
e entregou-lhe o objeto cortante.
Poucas criaturas se despem da vaidade
e se entregam confiantes no outro como esse homem o fez. Não se guardou para o
barbeiro. Não subestimou o toque da mulher ali chegada. Olhos fechados, se
colocou nas mãos femininas. A cena foi breve, mas o bastante para engrandecê-la
com aquilo que certamente muitos ignorariam.
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