segunda-feira, julho 07, 2014

ETÉREA



HOJE EU PERSEGUI O SOL até onde ele se fez presente no meu dia. Terminado o meu expediente, pela manhã, não quis voltar pra casa, mesmo estando meu companheirozinho canino a minha espera.

Não. Eu não perderia o espetáculo do dia ensolarado lá fora. Assim, depois de rodar pela cidade parei no parque, o dos Eucaliptos ( não o mesmo de antes, agora com muitos deles a menos ), pedi uma água de coco, sentei, levantei a saia do vestido longo e tomei um caloroso banho de sol.

Mas, com o passar das horas, o sol me fez caminhar até o fim da pista de cooper, e ali perto, na areia, senti o chão, toquei e abracei as árvores, experimentando essa minha relação pan, às boas gargalhadas conversando ao celular com uma amiga.

Dali do parque não poderia ver o sol se pondo, então busquei dois amigos, carreguei no peito muitos outros e fui pro alto do Cristo Magano, de onde nós três assistimos a noite engolir o dia e as luzes da cidade e das moradas rurais virarem vagalumes e barquinhos no mar que se fez no horizonte dali de cima.

Nunca o crepúsculo demorou tanto. E apesar do vento frio, a alma estava tão quente. Eu confirmava para eu mesma o quanto nasci para isso de ser livre, para isso de amar. E questionava o mundo, esse mundo em que as pessoas inventaram que só podemos amar uma vez, uma única pessoa, sedimentando sentimento, tornando pedra, fincando uma estaca no coração e um anel no dedo, apropriando-se da liberdade de amar do outro...

Como pode alguém viver a vida duplamente, inventando personas, deixando de ser inteiro para o outro mais sujeitado, e se entregar escancaradamente para o outro mais liberto?! Não vou afirmar nem negar amores com isso que coloco, mas ali, do alto, levei também esse amor comigo porque do contrário não seria eu. E entendi que o amo justamente por isso, pela sua falta de liberdade que se desmancha quando está comigo e se faz voar, ainda que suas aberturas não sejam extensivas ao amor... mas o que é o amor? Confiança diz do que é o amor? Lealdade? Quando nos declaramos em nossas incertezas, inseguranças, necessidades, do que fala nossa boca? Nosso agir? Por isso não sirvo para casamentos.

É. Não nasci para casamentos. Já os vivi. Neles não me encontrei. Fui tão mais eu antes e depois disso. Nos momentos de paixão, de proibição... a rotina nos perdeu. Perdemos também para os ciúmes, para os costumes. Todos que se casam deixam-se para trás, casam-se com o outro, não consigo. Eu não saberia me abandonar. Não mais. Me amo tanto. Me quero tanto. Arrependimento teria de sair desta vida sem ter me curtido na totalidade, como naquele momento crepuscular... entre as pessoas que escolhi... entre as lembranças que senti... no meu silêncio-alimento-encontro restaurador...

Hoje eu persegui o sol até o ocaso. Chamaram-me etérea por isso, o que ouvi pisando o chão e as folhas dos eucaliptos que exalavam seu perfume próprio. Senti o granulado da areia massageando meus pés, meus sagrados pés que me suportam e me dão sustentação na gravidade desse peso de mundo que sobre mim se projeta, um mundo do qual fugi por algumas horas para me aproximar da imensidão do universo, lugar onde me sinto mais ser, mais vivente e encontrada, e não uma ET, deslocada.

Lá de cima vi a cidade virar bolo de criança com bolinhas coloridas e velinhas acesas. Tudo parecia mais simples, bastava soprar e minha energia se espalhava sobre as luzinhas no mar em vastidão, enchendo de minha intenção o lar de cada pessoa ali debaixo, esperando que meu desejo tivesse tocado o coração e despertado a consciência delas para a grandeza da vida. Faço isso com alguns amores que recebem o meu torpedo mental, igual fiz ontem cerrando os olhos com força - o que fez vibrar meu telefone - ou da mesmíssima forma faço com aquela menina a quem digo eu te amo e ela me entende sem medo de confundir sentimentos... O medo. O medo é uma merda. Danifica tudo mesmo. O medo hostiliza, paralisa, emburrece, segrega...  Por isso tenho sido menos medos. Por tudo isso, sinto-me ir.

A sensação de brevidade me acompanha. Acordo como se fosse meu último dia. E toda eu me dou. A pilha facilmente gasta. Dou choque. A intensidade diz de como sou. Eu me apaixono. Eu me arrebento. Eu me rasgo e me conserto. E me vou (voo!). Dali mesmo daquele alto poderia voar. Sentimento desapegado. Já não sou daqui. Passei por este lugar e o que deixei? O que guardar? Os amores que cativei? Os que perdi? Os que libertei? As lições, todas todas aprendi. Nada do que me arrepender.

Agora é só esperar e partir...

 

Um comentário:

  1. O seu texto parece um pouco melancólico, cara poetisa. A melancolia possui a sua beleza. A minha produção literária também possui um pouco dessa característica. O ser humano é feito disso: momentos de alegrias e de tristezas. E isso é bom. Um grande abraço.

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