segunda-feira, julho 27, 2009

DOS RELACIONAMENTOS

“[...]Considerei sempre com desprazer o casamento. Não via nele servidão porque mamãe nada tinha de oprimida: era a promiscuidade que me repugnava. ‘Não se pode sequer chorar tranqüilamente à noite na cama se se tem vontade’, pensava com pavor.[...]”
In Memórias de uma moça bem-comportada, Simone Beauvoir
Quando li esse trecho do livro, há meses, eu pensei: “Puxa, essa sou eu!”. Hoje, não estou certa de quem sou pra mim. Estou numa fase indecifrável de mim mesma. As mulheres são assim, meio lunáticas, transitando entre seus desejos. Sobre o texto acima, bem, esse pensamento é uma memória do que Simone tinha por casamento quando criança. O que ela analisa aí é a falta de liberdade que temos (HOMENS, no sentido genérico da palavra)de perder nossa individualidade, nosso mínimo espaço de liberdade para nos expressarmos no momento mais entregue de nosso dia, na hora de dormir, quando estamos livres integralmente para refletirmos nosso dia, nossa vida; para divagarmos, sonharmos, chorar alegrias, tristezas; resmungar... Um momento que só nosso travesseiro ou espelho compartilham, a não ser que permitamos dividir e estender isso para mais alguém.
Hoje, diferentemente da primeira vez que vi esse trecho, bem, reavalio minha opinião. O pavor das pessoas não está em sufocar o choro, mas saber da possibilidade que esse choro poderá ser ignorado, que seu assunto vai ser monótono, suas alegrias e tristezas não serão atrativas para serem compartilhadas porque não bastará que apenas se divida o sentimento, e participe da vida do outro. Seu silêncio não será respeitado, nem suas reclamações ouvidas...As pessoas têm medo da recepção do outro, e isso novamente me faz refletir que sempre está no OUTRO, fora da gente, a expectativa da felicidade. E, além do mais, no texto da Simone, não há espaço para D.R.(discussão de relação). Primeiro porque o texto foi escrito numa época em que essa prática realmente era impraticável. Os homens tinham a primeira e última palavra na dinâmica dos relacionamentos. Hoje, na contemporaneidade, tem de existir duas vozes, duas vontades, duas pessoas na construção de uma relação, do contrário, a relação deixa de existir. Mas isso vale para qualquer relação em nossa vida, pois sempre haverá um outro, em qualquer contexto, que precisará nos ouvir e se fazer ouvido, e nessa dinâmica é que se constrói bases para convivermos, no mínimo, respeitosamente.
Contudo, apesar de estarmos vivendo avanços em inúmeras áreas do conhecimento, das relações humanas, apesar de duas vozes capazes de se fazerem ouvidas constituírem uma relação saudável(e não ideal), as pessoas não estão dispostas a discutirem relacionamentos, porque demanda auto-crítica, e hoje todos vivem um duelo entre seu ego e seu super-ego, e uma terceira pessoa nessa “relação” passa a ser intrusa. E aí credito à mídia grande parte da responsabilidade dessas “doenças sociais” que se estabelecem entre os relacionamentos humanos.
Nesse caso, o casamento, ou uma relação de companheirismo, que tem sido diluída pela pressa, comodidade e conforto da tecnologia (as relações virtuais); pela publicidade que vende arquétipos insustentáveis, sobretudo para as crianças; e à produção literária que se deixou empobrecer através de imagens esdrúxulas.Vejo no diálogo a única possibilidade possível de estabelecer entendimento entre as pessoas. E, nesse pensamento infantil de Beauvoir, não havia concessão em prol do outro, não havia concordância, havia a única opção de se existir uma relação estável – se anulando, e ausentando-se de si mesma.

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